terça-feira, 15 de setembro de 2009

O consumidor deve ser o rei. Mas às vezes abusa

A famosa frase “o cliente sempre tem razão” não traduz a realidade. Saiba como defender o seu negócio de reclamações indevidas e evitar disputas judiciais

Rogério Costa precisa ter paciência de Jó. Responsável pelo serviço de atendimento ao consumidor da fabricante de granola Kobber, de Diadema, na Grande São Paulo, ele ouve reclamação o dia inteiro.
Recentemente, quase perdeu as estribeiras. Uma cliente ligou acusando a granola da Kobber de ter quebrado o dente dela. Costa respirou fundo, pensou por alguns segundos e respondeu: “Precisamos do laudo de um dentista”.
Dias depois, o documento chegou. A cliente havia passado por um tratamento que deixara a sua arcada dentária sensível. Se entrasse na Justiça, as chances de ganhar a causa seriam mínimas. Mas a Kobber não quis correr o risco de prejudicar a sua imagem. “Mesmo sabendo que o dente dela já estava debilitado antes do consumo da granola, decidimos pagar uma indenização de R$ 800, correspondentes ao valor do tratamento”, diz Costa.
O cliente nem sempre tem razão. Mas, mesmo que não seja fácil convencê-lo a ponderar as razões da empresa, dá para evitar, na medida do possível, que conflitos com os consumidores se aprofundem. A principal medida é a informação. “Os dados sobre o produto ou serviço devem estar no site, na embalagem, na etiqueta, no manual, enfim, em todos os lugares possíveis”, recomenda o advogado Renato Cury, do escritório Pinheiro Neto.

Isso não significa que todos os problemas vão desaparecer. “Certa vez, uma cliente chegou com a camisa queimada e argumentou que a etiqueta não informava a temperatura ideal para passar a peça”, afirma Nora Almeida, supervisora da rede de moda tricô Beluga. Segundo Márcia de Oliveira, técnica da Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon-SP), uma etiqueta de roupa deve trazer informações como composição das fibras do tecido e a maneira de se lavar e passar o produto. “Mas não existe obrigação de especificar a temperatura do ferro”, diz. “É uma questão de bom senso tomar cuidado ao passar uma camisa de tecido fino.
Você já viu um fabricante de facas informar na embalagem que o consumidor não deve colocar o produto contra o corpo?”, diz Cury. Um Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) eficiente pode proteger o empreendedor.
Foi graças ao SAC que a advogada Maria Helena Bragaglia, do Demarest & Almeida, conseguiu a prova mais importante contra um consumidor que dizia que sua moto pegara fogo, sem motivo nenhum. Na gravação, o rapaz contava à atendente que havia esquecido a moto em uma garagem fechada. “Conforme prevê o manual do veículo, este procedimento não deve ser realizado. Temos, portanto, uma importante prova a favor da empresa”, afirma Maria Helena. “É importante não assumir uma postura de responsabilidade nas mensagens enviadas aos clientes sem apurar antes o que realmente aconteceu. Também é preciso responder aos consumidores em um prazo razoável”, aconselha Maria Helena (leia todas as recomendações no quadro abaixo).

COMO DOMAR CLIENTES INSATISFEITOSAs principais medidas para evitar danos e como implementá-las

>>> Forneça o máximo de informações sobre o produto ou serviço em todos os canais possíveis (site, embalagem, manual, etiqueta, etc.) >>> Mantenha um serviço de atendimento ao consumidor (SAC) com profissionais treinados e gravação das ligações >>> Não assuma a culpa antes de apurar a reclamação — a comunicação precisa ser formal e documentada.
Mas não demore a dar uma resposta >>> Solicite laudos técnicos ou médicos antes de a reclamação chegar ao Judiciário >>> Elabore um termo de quitação para o cliente assinar com a orientação de um advogado, caso resolva pagar indenização Quanto mais provas, melhor. Lembre-se de que o código de defesa do consumidor foi elaborado para proteger o cliente, que é considerado a parte mais frágil da disputa. “A lei coloca o consumidor em uma posição de privilégio para dar mais equilíbrio à relação”, afirma Cury.

Muitas vezes, o juiz determina a inversão do ônus da prova. Em vez de o cliente mostrar as razões da reclamação, a empresa acaba tendo que comprovar que está certa — o que pode ser muito mais complicado. “Em um caso de ingestão de alimento estragado, por exemplo, se a empresa não pediu um laudo médico para avaliar a saúde do cliente, como vai conseguir provar que não foi seu produto que fez mal?”, questiona Cury.

Apesar da posição privilegiada do cliente, o advogado ressalta que o código de defesa do consumidor não é conivente com abusos. Ele lembra um caso atendido pelo escritório, no qual uma indústria do ramo alimentício foi processada por danos morais. “O cliente comprou uma barra de cereal quebrada e pediu ao fabricante a reposição do produto. Mesmo após receber a barra de cereal solicitada, abriu um processo contra a empresa pedindo 40 salários mínimos de indenização, que é o teto máximo do juizado especial. O juiz, claro, julgou a causa improcedente.”

DO QUE ELES RECLAMAMOs assuntos líderes nos postos do Procon-SP no período de janeiro a junho de 2008

1º Telefonia (fixa, celular e serviço telefônico especial) 2º Cartões (crédito, loja e desconto) 3º Bancos comerciais 4º Aparelhos telefônicos 5º Eletrodomésticos, eletroportáteis e eletroeletrônicos 6º Cursos livres (informática, inglês e outros) 7º Móveis 8º Saúde (convênio médico/odontológico) 9º Financeiras 10º Energia elétrica 11º Água e esgoto 12º Carros (usados e novos) 13º Condomínio 14º Produtos de informática 15º TV por assinatura Fonte: Procon-SP

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