domingo, 23 de maio de 2010

Prestações a perder de vista dobram valor de produtos

Consumidores insistem em comprar a longos prazos, pagando juros altos e comprometendo o orçamento familiar, alertam economistas
Ricardo César

As possibilidades são chamativas para quem tem pouco dinheiro e muita vontade de comprar. O carro zero-quilômetro pode ser parcelado em até sete anos. Eletrodomésticos e eletrônicos, por 18 meses. Roupas, em até 12 parcelas. Com crédito em abundância e um cenário de crescimento da renda, o financiamento a longo prazo se tornou um caminho fácil para a aquisição de um mar de bens duráveis e não-duráveis. Mas essa estrada, porém, nem sempre leva ao destino da tranquilidade: prazos excessivamente longos podem fazer com que o consumidor morra na praia do mau negócio e da dívida, segundo economistas.

É necessário levar em consideração o tempo de vida útil do produto ou o momento em que ele começa a se depreciar, afirmam quatro especialistas ouvidos pelo POPULAR. Sob esta ótica, um financiamento longo pode deixar de valer a pena. “Os juros começaram a subir no País para conter o consumo. Por isso, financiamentos a prazos longos podem duplicar o valor da compra. Muitas das vezes, o produto pode não valer mais nada e o consumidor continuar pagando prestações porque financiou por muito tempo”, descreve o economista e especialista em finanças pessoais, Ot Vitoy.

DicaNeste momento de euforia da economia, a dica para adquirir qualquer produto segue a do tempo de vacas magras: é melhor poupar antes e comprar depois. Como nem sempre o consumidor pode ou quer pagar tudo num ato só, é preciso checar a real necessidade do bem à sua vida para que o financiamento não fique caro a ponto de se tornar um problema.

“O interessante é poupar dinheiro, dar uma boa entrada e financiar o restante por menos tempo possível. Financiamentos longos estão ainda propensos ao acaso. E se o trabalhador perder o emprego?”, argumenta o economista Eber Vaz.

“Uma alternativa, portanto seria olhar o tempo de garantia do produto ou avaliar sua vida útil, para saber quando aquele item começa a perder valor”, indica o economista José Gomes Sabino.
DesvalorizaçãoÉ clássico o exemplo de um carro, em que a garantia geralmente não ultrapassa a 36 meses. Quem optar por um financiamento com prazo acima de três anos pode levar para casa o ônus de ter um veículo que perderá valor de mercado. “E os bancos também sabem disso. Quando concedem um crédito com prazo superior ao da garantia do carro, eles traduzem tal risco na forma de juros mais altos.”

Na prática, quanto maior o prazo de financiamento de um veículo, maior a perda real para o consumidor. Em três anos, um carro sofre uma desvalorização no mercado de até 20%. Se não bastasse, a manutenção fica mais cara a partir deste período. Com o término da garantia, é preciso bancar não só a prestação do carro, mas também a manutenção. Sem contar os preços do licenciamento anual e do seguro do veículo. “E quem financiou o carro em suáveis e intermináveis parcelas pode acabar descobrindo que fez um mau negócio”, afirma a diretora da Escola Estadual de Defesa do Consumidor, Sara Saeghe Ximenes.

Nesta etapa do financiamento começam os descontentamentos. A Superintendência de Proteção aos Direitos do Consumidor (Procon) recebeu apenas nos primeiros quatro meses deste ano 3.729 reclamações associadas à prazos estendidos de veículos, cerca de 20% a mais que no mesmo período de 2009. O número alto se deve, segundo Sara, que também é diretora de Atendimento do Procon, pela ascensão de um consumidor intitulado de hiper vulnerável. “Eles são novos compradores, atraídos pelas facilidades e, logo, acabam vendo que fizeram um mau negócio”, explica.

A funcionária pública federal Cláudia Maria Mendes, de 50 anos, pode ser vista como exemplo. Antes mesmo da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), ela decidiu adquirir um carro zero-quilômetro em 70 meses. Hoje, com 18 prestações pagas, ela já analisa que não foi um bom negócio. “Parando para pensar não compensou. A parcela alta (de mais de R$ 800) e vai se estender por muito tempo. O carro, que custa cerca de R$ 30 mil, vai perdendo valor de mercado”, conta a servidora. “Espero que meu exemplo sirva de lição para quem pensa em fazer o mesmo. Não quero mais fazer financiamentos tão longos”, afirma a funcionária.

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